Disciplina - Ensino Religioso

Ensino Religioso

03/11/2008

Homofobia e discriminação a praticantes de religiões afro-brasileiras desmentem mito do país tolerante e avesso à discriminação

João Natal Bertotti  
O pai Jorge Kibanazambi, líder espiritual da Roça de Candomblé no Jardim Ana Terra, em Colombo, na região metropolitana de Curitiba, passou a fazer uma passeata por ano para mostrar que o seu culto religioso não é demoníaco, magia negra ou outra lenda do gênero. A última aconteceu dia 19 de outubro passado, durante a festa de Oxalá. Os cultos de matriz africana e o grupo LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) são hoje as principais vítimas de preconceito no país, de acordo com Perly Cipriano, subsecretário de Promoção dos Direitos Humanos da presidência da República.
O Paraná tem cerca de 2 mil terreiros de candomblé e umbanda, dos quais pelo menos 600 estão instalados em Curitiba e na região metropolitana. Alguns estão abertos oficialmente desde a década de 50, mas ainda hoje são alvo de preconceito da sociedade. Isso acontece no Brasil, um país cosmopolita, mestiço, mas cercado de racismo, homofobia, intolerância religiosa e outras discriminações.
O preconceito levou à morte 122 homossexuais no Brasil ano passado, conforme registros do Grupo Gay da Bahia. É também na Bahia que são registrados muitos casos de invasões e incêndios de terreiros de cultos afro-brasileiros, assim como no Rio de Janeiro, onde houve uma manifestação recente contra estes ataques vindos dos neo-evangélicos – fiéis de igrejas evangélicas mais radicais.
Em Curitiba, o último terreiro a ser incendiado foi a Casa Vó Cambinda, no bairro Abranches, há cerca de dois anos. “Eu não tenho provas. Um dia recebi ameaças de fiéis de outras religiões e noutro perdi tudo com o incêndio”, conta a mãe-de-santo Diva de Oxóssi. A casa foi reaberta após três meses graças à ajuda dos seguidores.
Segundo Dorival Simões, presidente do Cebras – Conselho Mediúnico do Brasil e Federação Paranaense de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro –, o apedrejamento é algo comum nos terreiros. Alguns casos vão parar na delegacia, outros viram ações de indenização por danos morais e materiais. “Há duas ações no estado por causa da intolerância religiosa, nas cidades de Terra Roxa e Umuarama”, informa Simões.
Explicação
Segundo especialistas ouvidos pela reportagem da Gazeta do Povo, a discriminação é uma forma de tentar se proteger contra a diferença, embora a diversidade seja um direito consagrado na Constituição.
A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) criou o projeto “Discriminação”, com o intuito de estudar os aspectos psíquicos que despertam o preconceito. Um dos objetivos do programa é a prevenção e preservação da saúde mental de quem vive este drama.
Segundo o psiquiatra gaúcho Telmo Kiguel, coordenador do departamento de psicoterapia da ABP, todos têm dentro de si a discriminação. “Eu, você e todos. É impossível não ter isto, como é impossível não sentir inveja, nem ciúme.”
Kiguel lembra que a criança quando nasce pode não reconhecer o pai, ou, às vezes, pode começar a chorar diante do avó ou de uma visita, por causa da ignorância ou por não reconhecer o outro. “Se ela é educada para aceitar o maior número de pessoas, terá de conviver com o branco e o negro da mesma forma. Mas se a família transmite algum preconceito, essa atitude pode marcá-la. Ela precisa aprender a conviver com o novo e as diferenças.”
A educadora Tânia Maria Baibich-Faria, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pós-doutora pela Universidade de Michigan e estudiosa da questão do preconceito, diz que todo aquele que foge do padrão social – branco, não-pobre e cristão – será discriminado. “Isso se torna natural de tal forma que as pessoas nestas condições sequer se dão conta de que são privilegiadas. A democracia racial é uma das vendas para que não se olhe o que está acontecendo na sociedade”, afirma a especialista, sobre um dos mitos nacionais, o da cordialidade racial.
De acordo com Tânia Maria, a pedagogia do antipreconceito é papel da escola, pois “o preconceito é como o vírus da gripe – uma luta que não termina, vai se desfigurando e se disfarçando.”
Segundo Perly Cipriano, a sociedade precisa pensar mais na criminalização da homofobia. “Os pais aceitam um filho especial, com síndrome de Down, cego, ou fruto da miscigenação racial. Mas a homofobia é alimentada dentro da própria família, no trabalho, na escola e em outros locais. Por quê?”, questiona.
Acessado em 03/11/2008 no sítio do Portal RPC. Todas as modificações posteriores são de responsabilidade do autor original da matéria.
Recomendar esta notícia via e-mail:

Campos com (*) são obrigatórios.