Disciplina - Ensino Religioso

Ensino Religioso

24/09/2007

O Ganges Sagrado

Ao longo da História, as fontes de água foram consideradas sagradas, merecedoras de reverência e respeito. Com a chegada das torneiras e da água engarrafada, esquecemos que antes de fluir pelos tubos condutores e antes de ser vendida aos consumidores embalada em plástico, a água é um presente da natureza.
Na Índia, todo rio é sagrado. Os rios são considerados extensões e manifestações parciais dos deuses, do divino. Segundo a cosmologia Rigvédica, a própria possibilidade de vida no planeta está associada com a libertação das águas celestiais empreendida por Indra, deus da chuva. Vrtra, inimigo de Indra e demônio do caos, escondeu e guardou as águas, inibindo assim a criação. Quando Indra derrotou Vrtra, as águas celestiais se precipitaram sobre a terra, e a vida teve início.
Segundo a cosmologia hindu, o Rio Ganges se origina nos céus. A Kumbh Mela, o grande festival que ocorre ao redor do Ganges, é uma celebração da criação. Segundo uma fábula, os deuses e os demônios lutavam pela kumbh (jarra, pote), onde se encontrava o amrit (néctar), criado pelo sagar manthan (o escumar dos oceanos). Jayant, filho de Indra, escapou com a kumbh e por 12 dias consecutivos os demônios lutaram contra os deuses pela posse da jarra. Finalmente, venceram os deuses, beberam o amrit e alcançaram a imortalidade.
Durante a batalha pela posse da kumbh, cinco gotas de amrit caíram na terra, em Allahabad, Haridwar, Nasik e Ujjain, as quatro cidades onde o festival da Kumbh Mela tem lugar. Até hoje, a cada 12 anos, cada uma dessas cidades é sede da mela. A Maha Kumbh Mela de 2001, em Allahabad, foi um dos maiores e mais espetaculares festivais jamais ocorridos. Cerca de 30 milhões de pessoas se reuniram na cidade sagrada para se banharem nas águas sagradas do Ganges.
O mais antigo e mais conhecido mito sobre a criação do Ganges é a lenda de Bhagirath. Bhagirath era descendente do Rei Sagar, o rei dos oceanos. O Rei Sagar tinha massacrado os demônios na terra e estava realizando um aswamedh-yagya (sacrifício de um cavalo), proclamando sua supremacia. Indra, deus da chuva e soberano supremo do reino dos deuses, temia perder seu poder, roubou o cavalo de Sagar, amarrou-o ao ashram do grande sábio Kapil. Naquela época, Kapil estava em profunda meditação, inadvertido da diabrura de Indra.
Quando o Rei Sagar ficou sabendo do cavalo roubado, enviou seus 60.000 filhos para buscá-lo. Os filhos, finalmente, encontraram o cavalo perto do sábio que meditava e começaram a armar um ataque contra ele. Quando o sábio abriu os olhos, ficou irado por encontrar os irmãos conspiradores, reduzindo-os a cinzas.
Anshuman, neto do Rei Sagar, eventualmente conseguiu reaver o cavalo do sábio Kapil. Anshuman reportou ao seu avô que o sábio, irado, tinha queimado seus 60.000 filhos. O único modo para que os filhos pudessem alcançar a abóbada celeste seria se o Ganges descesse dos céus até eles, para que a água pudesse purificar as cinzas de seus filhos. Infelizmente, Anshuman e seus filho Dilip não foram bem-sucedidos em sua tentativa de trazer o Ganges à terra.
Finalmente, Bhagirath, neto de Anshuman, foi aos Himalaias e começou a meditar, na cidade de Gangotri. Após uma longa meditação, o Ganges lhe apareceu em seu corpo físico, concordando em descer até a terra desde que alguém conseguisse amortecer o impacto de sua poderosa queda, pois, do contrário, a terra seria destruída pelo impacto. O Rei Bhagirath apelou para Shiva, que aceitou suavizar o impacto da descida do Ganges usando seu próprio cabelo. O rio seguiu Bhagirath até onde as cinzas dos filhos do Rei Sagar tinham sido empilhadas, purificando suas almas, e abrindo para eles o caminho até os céus.
Como o Ganges desce do céu, ele representa uma ponte sagrada para o divino. O Ganges é uma tirtha, um lugar de travessia de um ponto para outro. O Gangastothra-sata-namavali é uma ode ao rio que revela o profundo efeito do mesmo sobre a Índia. Essa ode-saudação contém os 108 nomes sagrados do rio.1 O papel do Ganges como mediador entre este mundo material e o plano divino toma forma entre os hindus nos rituais dos funerais. As cinzas de nossos antepassados e nossa família são lançadas no Ganges, de modo que, como os filhos do Rei Sagar, eles também consigam efetuar a transição para os céus. Eu nasci e cresci na Vale de Doon, delimitada pelo Ganges a leste e pelo Yamuna a oeste. Desde a infância, esses rios me nutriram e moldaram meu senso do sagrado. Uma das experiências mais emocionantes que tive nos últimos anos foi a imersão das cinzas do meu pai no Ganges, em Rishikesh.
Como o Ganges, o Yamuna, o Kaveri, o Narmada e o Brahmaputra são todos rios sagrados, e são adorados como deusas. Acredita-se que eles purificam e descarregam as impurezas materiais e espirituais. Suas renomadas características de purificação são os motivos pelos quais, em seu banho diário, os hindus devotos cantam: "Ó Mãe Sagrada Ganga, Ó Yamuna, Ó Godavari, Ó Sarasvati, Ó Narmada, Ó Sindhu, Ó Kaveri. Que vocês se comprazam em se manifestar nessas águas com que me purifico."
O Ganges não só possui as qualidades purificadoras da água, como também está saturado de minerais antissépticos que matam bactérias. Pesquisas bateriológicas recentes confirmaram que os germes da cólera morrem nas águas do Ganges. O Dr. F.C. Harrison escreveu:
" Um fato peculiar que nunca foi satisfatoriamente explicado é a rápida morte, de três a cinco horas depois, do Cholera vibrio nas águas do Ganges. Quando nos lembramos que as águas de esgoto contém a presença de numerosos cadáveres, muitos dos quais morreram de cólera, e dos milhares de nativos que se banham, parece notável a crença dos hindus de que a água deste rio é pura e não pode ser contaminada e de que eles podem beber e se banharem com segurança; ela deveria ser confirmada através da pesquisa bacteriológica moderna."2
Não é de maravilhar que o povo da Índia tem o Ganges e os outros rios em alta estima e acredita que eles possuem poderes misteriosos. Não é de surpreender que, apesar da colonização da Índia pela Coca-Cola e pelo McDonald’s, milhões de pessoas se sentem atraídas pelo Ganges por ocasião da Kumbh Mela.
Edit: Acessado em 28/12/2009 no sítio Imediata
Todas as modificações posteriores são de responsabilidade do autor original da matéria.
Recomendar esta notícia via e-mail:

Campos com (*) são obrigatórios.