Ensino Religioso
04/02/2013
“Os ateus também podem desenvolver valores sagrados”, afirma estudioso
Jarbas AragãoPhilippe Portier, diretor de estudos na Escola Prática de Altos Estudos e diretor do Grupo Sociedades, Religiões, Laicidades da França, deu uma entrevista à revista francesa La Vie. Ele faz uma análise dos motivos pelos quais crescem os conflitos de ateus e religiosos e como isso se revela no campo político.
É inegável que o número de ateus está aumentando na Europa, não apenas na França. Mas o que chama atenção realmente é o crescimento dos “sem religião”, ou seja, há um “distanciamento com a crença em Deus” em vários setores da sociedade.
Portier revela que 28% a 30% da população da França já se diz “sem Deus". Entre os jovens, entre 18 e 30 anos, a fração sobe para 35%”. Paralelo a isso, o número de agnósticos também aumentou. Ele acredita que “para essas pessoas, probabilistas, Deus talvez exista. E esta zona cinzenta se desenvolve. É, talvez, a população mais importante. Eles são em torno de 35-40% da população”.
Do outro lado, a proporção de pessoas que estão certas que Deus existe é de 25% a 30%. Só que “para esses crentes, Deus não é sempre o mesmo. Não obedece necessariamente às regras da religião instituída”, diz o estudioso.
Para Portier, o elemento diferenciador é que “Entre aqueles que dizem “eu não creio em Deus” e aqueles que dizem não ter nenhuma crença espiritual, há uma brecha considerável… Há muitas vezes um espiritualismo difuso, que não se identifica com o materialismo tradicional que está na origem do ateísmo. E nas pesquisas qualitativas feitas com ateus, encontramos muitas vezes a ideia de que o homem estaria dotado de um espírito. O que remete a uma possível ideia de um espírito que ultrapassaria os nossos próprios corpos”.
Sendo assim, é equivocado pensar que é todo ateísmo é fortemente militante, pois “Na sociologia das religiões… uma dessas teses, defendida por pesquisadores italianos, os ateus produzem significações religiosas. Mais precisamente, eles sacralizariam normas de existência que fazem duvidar da possibilidade de uma crítica. Assim, haveria uma religião civil e mesmo uma religião política para qualificar alguns valores que são promovidos pelos ateus fora de qualquer crença em Deus”. Isso pode influenciar os rumos da humanidade daqui para frente.
Ou seja, é crescente o estabelecimento de uma “religião laica”, que é uma concepção muito mais política. Por exemplo, “Trata-se de um Estado que fixa normas de existência com uma escola que é exclusivamente laica. Esta religião pode desenvolver uma moral laica, difundida pela escola. Ela engloba, portanto, a sociedade em seu conjunto. Nesse sistema de religião laica não se procura necessariamente suprimir autoritariamente o fenômeno religioso. Ao contrário, quer-se privatizá-la de maneira rigorosa: a religião é expulsa para a esfera privada”.
A complexa questão da falta de fé pode revelar que alguns ateus “podem desenvolver valores sagrados fundados na autonomia do sujeito: os direitos da criança, a possibilidade de as mulheres escolherem sua própria existência, etc., sem que haja nisso necessariamente uma referência a um modelo de tipo laico… Para muitos ateus, o indivíduo constrói sua própria existência, de maneira autônoma. Por essa razão eles são favoráveis às reformas sociais. Eles defenderam a contracepção e o aborto nos anos 1960 e 1970, depois a procriação assistida nos anos 1980. Hoje, eles são favoráveis à eutanásia e ao casamento gay. A questão de fundo é que defendem o fato de que o indivíduo deve poder construir sua própria existência de maneira autônoma”.
O maior embate está com os crentes que encontram uma referência em normas superiores. Essa transcendência fortalece “uma moralidade que foge à liberdade do sujeito”. Donde surge “uma clivagem muito clara entre crentes e ateus em relação a temas sociais… Sempre há uma militância ateia em oposição a uma militância religiosa. E nesse momento, dois campos dão o tom nos debates públicos. Eu vou usar o termo “guerra de culturas”. Mais precisamente, de um lado nós temos a cultura da autonomia do sujeito. Do outro, uma cultura da normatividade. E entre essas duas culturas, há diferenças muito importantes sobre a maneira de conduzir uma sociedade”.
O erudito finaliza, enfatizando que é justamente por isso que se vê na Europa um grande conflito entre os religiosos e grupos liberais [antirreligiosos], como mostrou a recente passeata em Paris contra a legalização do casamento gay, com quase um milhão de participantes. Esse embate de ideias tem deixado membros de igrejas e sacerdotes “mais indenitários e mais apegados aos seus princípios morais”. Com informações Unisinos.
Esta notícia foi publicada no site Gospel Prime em 04 de Fevereiro de 2013. Todas as informações nela contidas são de responsabilidade do autor.