Ensino Religioso
19/12/2013
Jogadores muçulmanos podem quebrar jejum na Copa, diz líder religioso
Além das rivalidades esportivas, a Copa de 2014 traz ao Brasil um tema que vem sendo alvo de debates acalorados no futebol internacional: o Ramadã. O nono mês do calendário islâmico é sagrado e exige oração e jejum do nascer ao pôr-do-sol. No próximo ano, o Ramadã começa no dia 28 de junho e coincide com as oitavas de final do Mundial, o que pode ser um desafio para alguns jogadores que seguem à risca a religião. Para citar exemplos mais ilustres, o francês Frank Ribéry, o alemão Ozil e o marfinense Yaya Toure são muçulmanos. Isso sem falar das seleções de Irã, Argélia e Bósnia, equipes com predomínio de atletas com esta orientação religiosa.De acordo com o Sheikh Juma Momade, enviado do Ministério de Assuntos Islâmicos do Kuait e membro do Centro de Divulgação do Islã para a América Latina, o jejum não prejudica o desempenho do jogador, uma vez que a prática pode até deixá-lo mais disposto.
“Para nós é importante que o muçulmano seja saudável para poder adorar o Senhor. O jejum proporciona saúde ao corpo e ao espírito e pode ajudar o jogador a fazer uma boa partida. Temos vários exemplos de atletas, em vários clubes europeus, que cumprem o jejum no Ramadã e continuam jogando bem”, comentou Momade em entrevista ao UOL Esporte.
Contudo, há algumas exceções. Segundo Momade, o islamismo é flexível em certos pontos. “Crianças, pessoas doentes, mulheres grávidas, idosos e viajantes não são obrigados a jejuar”, explicou o religioso. No caso dos jogadores que virão disputar a Copa do Mundo, existe a possibilidade de quebrar o jejum nos dias em que tiverem competição.
“A escolha é de cada um. Deus não quer criar dificuldades e nem impedimentos na prática humana, mas a religião também não pode ser levada na brincadeira. Não se pode deixar de jejuar no mês sagrado por qualquer motivo”, ressaltou. “Mas se o jogador acredita que isso vai prejudicar o seu desempenho e o da equipe, então ele pode optar por não fazer o jejum. Contando, claro, que cumpra esses dias posteriormente, quando voltar para a casa”, pontuou o religioso.
Esta também foi uma decisão do Al-Azhar, maior instituto teológico sobre a religião. Em 2010, a entidade se posicionou após uma polêmica envolvendo o clube alemão FSV Frankfurt, que proibiu os jogadores de seguir o mês sagrado sem pedir uma permissão à diretoria. De acordo com a entidade, caso o atleta tenha um contrato profissional como sua única fonte de renda e seu desempenho seja perturbado pela prática, o jejum pode ser interrompido.
Na comunidade médica, a questão do jejum ainda divide opiniões de especialistas ligados ao esporte. No ano passado, o Centro de Pesquisa e Avaliação Médica da Fifa reuniu uma equipe para debater sobre o assunto. O resultado do estudo, que saiu um pouco antes das Olimpíadas de Londres, foi publicado no Journal of Sports Science e aborda a questão da saúde e o desempenho do jogador durante o período do Ramadã.
“O objetivo do estudo não foi o de ajudá-los a decidir se devem ou não jejuar”, explicou Yacin Zerguini, membro do comitê médico da Fifa em entrevista ao site da entidade. Segundo ele, a meta principal foi reunir o máximo de conhecimento possível acerca do tema e auxiliar os atletas a lidar com as situações que vão vivenciar.
Entre os principais desafios está adaptar a rotina de acordo com a dieta, que pode afetar o sono do atleta. “O jejum altera o relógio biológico dos jogadores. É importante saber reorganizar o sono e lidar psicologicamente com as mudanças na alimentação e na hidratação durante o mês”, contou Zerguini.
Durante a pesquisa com os jogadores, o médico também observou que muitos jogadores que atuavam nas principais ligas europeias não tiveram problemas em jogar durante o Ramadã. Segundo ele, as melhores estratégias para enfrentar o jejum vão além da capacidade física e entra na esfera pessoal. “Esses jogadores jogam em um determinado nível e até o elevam quando atuam em jejum. A superação parte dos próprios atletas, e não do metabolismo do corpo”, comentou.
Um exemplo de superação fora do futebol, ainda na esfera esportiva, é o do ex-jogador de basquete Hakeem Olajuwon. O nigeriano naturalizado americano atuava no Houston Rockets e foi um astro da NBA na década de 1990. Diante das dúvidas de que seria capaz de jogar em alto nível durante o Ramadã, o pivô deu a resposta nas quadras. Durante as competições, mesmo estando 12 horas sem comer e beber qualquer coisa, o desempenho de Olajuwon se manteve no mesmo patamar. Em fevereiro de 1995, em pleno período sagrado, o gigante foi nomeado o jogador do mês pela NBA.
Com a internacionalização do futebol é possível ver, cada vez mais, uma quebra de paradigmas comportamentais. Além das concessões do islamismo, também é possível ver mudanças dentro do próprio cenário futebolístico. A mais expressiva, porém, foi a mudança do prêmio do “Homem do Jogo”, do Campeonato Inglês.
Era costume presentear o melhor jogador com uma garrafa de champanhe. Mas alguns incidentes embaraçosos envolvendo atletas muçulmanos fizeram com que a Liga criasse uma opção não alcoólica para esses jogadores. O caso famoso foi o de Yaya Touré, destaque do Manchester City, que recusou o prêmio no ano passado. “Eu sou muçulmano. Não bebo, então pode ficar com ela”, disse o craque ao devolver a garrafa.
Esta notícia foi publicada no site Boa Informação em 17 de Dezembro de 2013. Todas as informações nela contidas são de responsabilidade do autor.